Discurso 1, §1 - Do sustento que devem os senhores aos servos:
«E não será manifesta injustiça, se trabalhando o escravo de sol a sol, para que coma e se regale seu senhor, não lhe dê o mesmo senhor o sustento daquilo mesmo que trabalha? Quem o duvida? E mais quando o escravo (ainda com ser incapaz de todo o domínio, porque tudo o que adquire, adquire para seu senhor) tem rigoroso direito para haver do senhor o sustento do que trabalha, como coisa própria e sua.
(...) Digo que lhes não dão o sustento ou tempo suficiente, em que o possam buscar, porque eu não condeno (antes louvo muito) o costume, que praticam alguns senhores neste Brasil, os quais achando grande dificuldade em dar sustento aos escravos, que os servem das portas a fora nas lavouras dos engenhos, lhes dão em cada semana um dia, em que possam plantar e fazer seus mantimentos, com os quais os que se não dão à preguiça têm com que passar a vida.
E quem lhes tira esse tempo (me direis vós) se não proibimos a nossos escravos que nos domingos e dias santos busquem sua vida e trabalhem para si? Nos domingos! Nos dias santos! Dizei-me, senhores meus: onde vivemos? Em Berberia entre os mouros de Argel ou no Brasil entre os cristãos da Baía?»
Jorge Benci de Arimino, Economia cristã dos senhores no governo dos escravos... reduzida a quatro discursos morais, 1705.